segunda-feira, 13 de abril de 2009

É tarde no planeta

Olá!
"É tarde no planeta!", disse aquela personagem fascinante de Lygia Fagundes Telles, Rosa Ambrósio, uma atriz decadente, vivendo o seu ocaso. Não vivo meu ocaso, tampouco sou decadente (acho que não). Mas, olhando em torno, posso dizer como ela, "É tarde no planeta!". Tudo em volta é noite. Dou uma pausa nas provas e ponho Barber para tocar, o Adágio, é claro. A música é noturna, como a escuridão dela, da noite. Anoiteço também.
Do Jorge.

domingo, 5 de abril de 2009

Sobre romances policiais


Olá!


Talvez um dia eu precise me sentar no divã do psicanalista (como já fiz no passado) para descobrir de onde vem a minha obsessão pelos romances policiais. É preciso que se diga que entrei pela porta da leitura, em grande parte, através deles. Um dos livros de que tenho a mais antiga memória de leitura (pelos sete ou oito anos) é "O príncipe fantasma" (e que, outro dia, encontrei na biblioteca da escola em que trabalho), da dupla Ganymmedes José e Tereza Noronha. É uma novelinha para adolescentes, mas com doses altas de suspense e terror. Uma leitura eletrizante. Depois, veio Agatha Christie. Ah!, é até difícil falar da minha paixão por essa adorável velhinha inglesa. Li (devorei) com avidez TODOS OS SEUS LIVROS, tenho a maior parte deles conservado na minha biblioteca. O imaginário da minha adolescência foi povoado pelas aventuras de Poirot e Miss Marple.






Mas depois, vieram os outros livros. Quer dizer, com o tempo, meu gosto "se refinou" e foi para outros lados. Mergulhei na densidade de Clarice Lispector, no mistério narrativo de Lygia Fagundes Telles, descobri as invenções lingüísticas de James Joyce, a prosa interior de Virginia Woolf, os poetas, os grandes romancistas brasileiros e estrangeiros. Fiquei seletivo. Tive, então, vergonha das minhas leituras juvenis, confessava para pouca gente que tinha quase todos os livros da Agatha em casa. Era uma espécie de esnobismo literário, uma certa vergonha de parecer chinfrim perto de outros leitores. Então, escondia no fundo esse meu gosto pelos livros de mistério.






Mas isso passou, enfim. Reconciliei-me com os livros policiais. Lembro que foi numa aula do mestrado. Nós discutíamos com um professor o conceito de "alta literatura", a partir do livro da Leyla Perrone-Moisés sobre o tema. Um colega então começou a desancar o Paulo Coelho. Todos concordaram com ele, claro, num curso de mestrado em Estudos Literários, ninguém sério poderia considerar o Paulo um autor de qualidade. Então, dando una lição que eu nunca esqueci, o professor disse: "Quem instituiu isso, de achar que o cara não vale nada? Pensem nisso e descobrirão que nessa afirmação há muito preconceito literário, e isso é ruim". Ficamos calados. E eu pensei, imediatamente, na minha relação de amor e ódio com os livros policiais. Há uma parcela grande da intelectualidade que os considera sub-literatura, livros que servem com divertimento e nada mais. Puro preconceito. Ora, se o próprio Barthes foi capaz de dizer, em "O grau zero da escrita", que Agatha Christie foi uma autora genial ao dessacralizar a figura do narrador, tornando-o o assassino de um dos seus livros, por que não se pode considerar os livros policiais como livros sérios, com valor literário? Foi uma certeza que eu tive naquela tarde.






Uma certeza que tenho até hoje. Hoje, posso confessar, sem nenhuma vergonha, que amo a literatura policial. Que me delicio com a leitura dos livros da Agatha (faz tanto tempo que esqueci a trama de muitos deles, então reler é sempre uma nova leitura), de Donna Leon e P. D. James. É um universo maravilhoso porque, sobretudo, nesses nele há, segundo a premissa de Harold Bloom, uma das maiores virtudes da literatura: a de provocar prazer no leitor.






Do Jorge.