terça-feira, 17 de novembro de 2009

Uma paixão

Olá!

Amanhã, por orientação da Secretaria de Educação, deveremos ler um texto, à nossa escolha, para os nossos alunos, entre 15h30 e 15h45. 15 minutos de leitura. Fiquei pensando no que ler para os meninos. lembrei do conto "A mão no ombro", da Lygia Fagundes Telles e que gosto muito, mas não decidi na hora. Fiquei de pensar melhor. Quando cheguei em casa, depois da minha corrida diária e do banho, fui até minha estante olhar para aqueles livros, para que eles me revelassem o texto ideal. Sim, amigos, os livros me dizem coisas extraordinárias. Por isso os levo tão à sério, por isso escolher um texto literário para uma turma, um texto curto que caiba em 15 minutos é, para mim, uma tarefa séria. Por isso fitei as lombadas. E veio. A resposta. O poema "Para a feira do livro", do João Cabral de Melo Neto. "Perfeito", eu disse, retirando as Obras Completas do poeta pernambucano, o poema me veio de cor antes que eu chegasse a ele:


PARA A FEIRA DO LIVRO


A Ángel Crespo


Folheada, a folha de um livro retoma
o lânguido vegetal de folha folha,
e um livro se folheia ou se desfolha
como sob o vento a árvore que o doa;
folheada, a folha de um livro repete
fricativas e labiais de ventos antigos,
e nada finge vento em folha de árvore
melhor do que o vento em folha de livro.
Todavia, a folha, na árvore do livro,
mais do que imita o vento, profere-o:
a palavra nela urge a voz, que é vento,
ou ventania, varrendo o podre a zero.


Silencioso: quer fechado ou aberto,
Incluso o que grita dentro, anônimo:
só expõe o lombo, posto na estante,
que apaga em pardo todos os lombos;
modesto: só se abre se alguém o abre,
e tanto o oposto do quadro na parede,
aberto a vida toda, quanto da música,
viva apenas enquanto voam as suas redes.
Mas apesar disso e apesar do paciente
(deixa-se ler onde queiram), severo:
exige que lhe extraiam, o interroguem
e jamais exala: fechado, mesmo aberto.



Os olhos marejaram, é claro. Nunca alguém foi tão preciso ao descrever o amor aos livros. A comparação entre o livro e a árvore, entre as folhas dele e dela, é algo sublime. A árvore, como o livro, personifica, ao mesmo tempo, a idéia de sabedoria e de eternidade. É o que o livro representa para mim, é o que amanhã, depois de ler o poema, pretendo discutir com os alunos, o saber e o sempre, o eterno, o perene. Agradeci pelo dom de ser leitor. Um dom raro, hoje em dia, que guardo como um tesouro. Como meus livros.


Do Jorge.
P.S.: a estante da foto é a minha própria.

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