quarta-feira, 16 de maio de 2012

Voltei a postar!

Olá!


Ah, as referências! Pensando em como voltar ao blog, me lembrei não sei por que de um show do Chico Buarque em que ele começa com a canção "Voltei a cantar", que pertenceu ao repertório do grande (e esquecido) Jorge Veiga, cantor dos anos 30 que vivia anunciando a aposentadoria, mas que acabava sempre "voltando a cantar". Achei o título perfeito para essa volta. Afinal, voltei a postar.

O certo é que voltei, sempre volto, sempre voltarei. Em carne ou em espírito, tanto faz. O cotidiano? Continua o mesmo, as aulas, as obrigações, as leituras, ô, ladainha! Mas não por isso sumi. Sumi porque sumi. Oras. É como disse o Campos de Carvalho, explicando a um repórter porque ficou quarenta anos sem publicar um livro novo: "Estava feliz demais para escrever". Não que agora esteja infeliz. Aliás, sou o rei dos céticos e não acredito em felicidade-infelicidade. São estados que momentâneos, não coisas permanentes, como pensam muitos. É que não queria escrever, quis viver. Agora. Agora quero escrever, simples assim. Estágios d'alma, diria eu se fosse um poeta romântico do século XIX, tuberculoso e infeliz. Mas não sou. Por isso, tento justificar essa compulsão por escrever, porque o que faço aqui (que é o mesmo que fazem aqueles que publicam livros: abrir-se) é uma compulsão, não há dúvida. Nem tente compreender, porque aí entramos no terreno de Freud-Jung-Lacan, a chapa do ego vai esquentar!... falava mesmo sobre o que? Sei lá. Aliás, não sei por que, mas agora ouvi a vozinha do Caetano cantando no meu ouvido, "esse papo já tá qualquer coisa, / você já tá pra lá de Marrakesh"...

Como prova do meu retorno, posto o poema do dia (me refiro, é claro, ao dia em que me dá na telha escrever), bem ao espírito do que disse hoje. Trata-se de "Guardar", do Antonio Cícero, irmão da Marina Lima e parceiro seu em muitas canções. Um puta poeta, com o perdão do cacófato e do chulismo, que dá aqui uma possível explicação para a  compulsão de que tanto falo. Ou não.




GUARDAR



Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.

Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.

Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.

Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.

Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.


(IN: Guardar, 1997. p. 337)


Do Jorge.

2 comentários:

Jorge Verly disse...

Olá!


Ah, as referências! Pensando em como voltar ao blog, me lembrei não sei por que de um show do Chico Buarque em que ele começa com a canção "Voltei a cantar", que pertenceu ao repertório do grande (e esquecido) Jorge Veiga, cantor dos anos 30 que vivia anunciando a aposentadoria, mas que acabava sempre "voltando a cantar". Achei o título perfeito para essa volta. Afinal, voltei a postar.

O certo é que voltei, sempre volto, sempre voltarei. Em carne ou em espírito, tanto faz. O cotidiano? Continua o mesmo, as aulas, as obrigações, as leituras, ô, ladainha! Mas não por isso sumi. Sumi porque sumi. Oras. É como disse o Campos de Carvalho, explicando a um repórter porque ficou quarenta anos sem publicar um livro novo: "Estava feliz demais para escrever". Não que agora esteja infeliz. Aliás, sou o rei dos céticos e não acredito em felicidade-infelicidade. São estados que momentâneos, não coisas permanentes, como pensam muitos. É que não queria escrever, quis viver. Agora. Agora quero escrever, simples assim. Estágios d'alma, diria eu se fosse um poeta romântico do século XIX, tuberculoso e infeliz. Mas não sou. Por isso, tento justificar essa compulsão por escrever, porque o que faço aqui (que é o mesmo que fazem aqueles que publicam livros: abrir-se) é uma compulsão, não há dúvida. Nem tente compreender, porque aí entramos no terreno de Freud-Jung-Lacan, a chapa do ego vai esquentar!... falava mesmo sobre o que? Sei lá. Aliás, não sei por que, mas agora ouvi a vozinha do Caetano cantando no meu ouvido, "esse papo já tá qualquer coisa, / você já tá pra lá de Marrakesh"...

Como prova do meu retorno, posto o poema do dia (me refiro, é claro, ao dia em que me dá na telha escrever), bem ao espírito do que disse hoje. Trata-se de "Guardar", do Antonio Cícero, irmão da Marina Lima e parceiro seu em muitas canções. Um puta poeta, com o perdão do cacófato e do chulismo, que dá aqui uma possível explicação para a compulsão de que tanto falo. Ou não.


GUARDAR



Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.

Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.

Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.

Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

(IN: Guardar, 1997. p. 337)


Do Jorge.

L. H. S. Leão disse...

Graças a Deus você voltou! Eu já estava pensando que você tinha entrado em coma, morrido ou eu sei lá!