domingo, 10 de julho de 2011

Um sujeito concreto





Olá!






Morto em 2003, Haroldo de Campos foi o grande nome da poesia concreta no Brasil. Ao lado de irmão Augusto e de Décio Pignatári, fundou, nos anos 50, o grupo "Noigrandes", que lançou o movimento concreto e que tanto influenciou e influencia poetas. Quem nunca escreveu um poema concreto que atire a primeira pedra.





Há quem lhes torça o nariz, que diga que não há lirismo nesses textos - e, se não há lirismo, não é poesia. Para eles, a poesia concreta é apenas um amontoado de palavras, unidas por uma (i)lógica matemática, geométrica, figurativa. E só.





Para mim, é o contrário. Aliás, é nessa lógica que vejo a beleza e o sentido da escrita, em tudo criativa e revolucionária, produzida por Haroldo e pelos outros. Lirismo é o que não falta em versos como "vem navio / vai navio / vir navio / ver navio / ver não ver / vir não vir / vir não ver / ver não vir / ver navios". Penso em mil sentidos, da saudade que não se sacia à eterna viagem que é a vida. E grande poesia não é isso, minha gente, não é a possibilidade de, com mil olhos, fazer mil leituras diferentes de um poema?





A lavra de Haroldo tem essas e muitas outras preciosidades. Um bom começo para quem quiser conhecê-lo melhor é pequena coletânea "Melhores poemas de Haroldo de Campos", da Global, organizada pela professora da Université de Aix-en-Provance Inês Oseki Dépré. Trata-se de um seleção, como o nome indica, de seus poemas mais significativos, extraídos da vasta produção de Haroldo, desde "O auto do possesso" (1949) até "Crisantempo" (1994). Vale também ler as muitas "transcriações" (que é como ele chamava as suas traduções) de obras fundamentais da literatura universal, como "Qohélet / O-que-sabe / Eclesiastes", tradução do livro bíblico sapiencial, a "Ilíada", de Homero, "Pedra e luz na poesia de Dante" e "Cantares", de Ezra Pound. Haroldo fez dessas obras coisas absolutamente novas, como se, pelo fio da tradução, surgisse uma terceira voz, fruto do diálogo entre os autores traduzidos e esse poeta extremamente criativo e genial.





E para encher o domingo de grandeza concreta, posto um de seus poemas, sem título, do livro "Lacunae", de 1973, em que Haroldo de Campos se debruça sobre este ofício, o da poesia. Entre tantos percursos e percalços, resta ao poeta apenas esta certeza: o eu. Que é seu norte e sentido, sempre. Vejam como é belo:






o poeta é um fin

o poeta é um his





poe

pessoa

mallarmeios





e aqui

o meu
dactilospondeu:





entre o

fictor

e o histrio



eu




Do Jorge.

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