segunda-feira, 14 de abril de 2008

Sobre o declínio e as invasões




Olá,


Esse fim de semana, revi dois filmes que há muito estavam esquecidos em mim. Esquecidos, não, pois nada se esquece. Hibernavam, quero dizer, a emoção de tê-los visto em mim se guardava. Para se mostrar, quando conveniente. Como neste fim de semana.
Os filmes aos quais me refiro são os magníficos "O declínio do império americano" e "As invasões bárbaras", do diretor canadense Denis Arcand. "O declínio..." é de 1986 e "As invasões...", de 2003. Dezete anos separam os filmes. Que estão para sempre conectados entre si. As histórias são complementares. O primeiro trata da preparação de um almoço pelos professores universitários (de História) Rémy, Claude e Alan, enquanto suas mulheres discutem numa academia de ginástica. Lá e cá não se fala de outro assunto que não o sexo. Quer dizer, o sexo é o mote para que entre todos os anseios da geração 60 chegando à maturidade numa época conturbada como o final do século XX. O segundo filme mostra o mesmo grupo, agora reunido por um motivo não tão trivial: a doença incurável de Rémy. Seu filho, um yuppie que vive em Londres, organiza o reencontro dos amigos do pai, para que este possa ter uma morte digna e cercada de afeto. Trocando em miúdos, seriam estes os enredos dos filmes.
Mas, há muito além disso. As fabulosas interpretações (todos de atores pouco conhecidos, canadenses todos) fazem com que se tenha mesmo a impressão de que são realmente ligados por este laço que chamamos de amizade. Tudo é natural e espontâneo. Outro dado é que os dois filmes retratam momentos de desesperança pós-moderna, sobretudo "As invasões bárbaras". O pai, Rémy, vê tudo aquilo que ele ajudou a erguer, quer dizer, vê o ideal socialista desmoronar, em parte pela sua doença, em parte pelo fato de o filho, com seu "way of life", representar o oposto de suas crenças. Sintezar, enfim, o triunfo do capitalismo, do consumismo, do individualismo. Entretanto, esse isolamento é quebrado pela reunião promovida pela doença de Rémy, que o faz reatar laços com seus amigos (do primeiro filme) e com o filho. Há uma troca fundamental de experiência, há o toque (inconciliável, via teoria) entre as ideologias dominantes do século XX (capital e social) e postas em cheque neste início do XXI.
Filmes extraordinários, obrigatórios, repletos de encontro, de alegria, de profundeza intelectual e de beleza artísticas. De emoção e sentimentos. Filmes, sobretudo, plenos de reflexão sobre a vida, sobre o ser humano e sobre os laços que afetivos que o definem.


Do Jorge.

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